Francisco que virou Orlando que virou Fernando que virou Fernanda que virou Kelly Christina, era um rapaz bonito, paquerado, conquistado e conquistador. Saiu de sua terra natal, lá pelas bandas do nordeste, após se comprometer com bela moça de família abastada, sem, contudo, assumir os atos amorosos praticados, não tendo alternativa senão fugir para não ser castrado ou morto. Foi para o Rio de Janeiro, Capital da Republica de então, centro de múltiplas facetas, onde a alegria convive com a tristeza e a sorte com o infortúnio. Em lá chegando não lhe faltava lindas donzelas da Zona Sul para o seu deleite, fazendo do amor sua verdadeira profissão. Para se manter financeiramente à noite namorava matronas senhoras, funcionárias públicas bem aquinhoadas, proprietárias de belos apartamentos, antigas amantes de parlamentares e ministros do governo, que na decadência física mantiveram-se empregadas com altos vencimentos, pelos prazeres de outrora fornecidos aos decrépitos senhores. Circulando em Copacabana, nosso personagem, conheceu prósperos costureiros e figurinistas, príncipes e imperadores do Municipal em desfiles de carnaval, com suas plumas e paetês, terminando por se envolver em troca de vida fácil, dinheiro e mordomia. Transmudou-se, passou a ser ativo e passivo no sexo, numa identidade múltipla, de tal forma que com o passar dos anos resolveu assumir a sua posição de gay. Para tanto deu início a uma nova atividade financeira para sobreviver promovendo shows artísticos em boates, teatros e circos. O tempo, senhor de tudo, se encarregou do desgaste físico de Kelly, e, em decadência, envolvida com drogas, de bar em bar, de delegacia em delegacia, não tendo mais caminho certo, seguiu rumo à sarjeta. Sujo, alquebrado, foi encontrado por uma alma boa que o levou até uma igreja, apresentando-o ao pároco, homem de muita sapiência, que o conduziu para uma fazenda de recuperação de drogados, dando-lhe a oportunidade de retornar a uma vida normal, conforme o seu estado natural, com responsabilidade, amor verdadeiro ao próximo, capaz de formar a célula social, primordial para uma civilização digna – a família. Kelly que foi Fernanda, que foi Fernando, que foi Orlando, voltou a ser Francisco, arranjou emprego, voltou aos estudos, formou-se em Contabilidade, montou escritório, prosperou, casou-se, teve filhos, esqueceu o passado negro, possui bom apartamento, carro do ano, casa de praia, dedicado aos bons costumes que lhe permitiram aprender.
MORAL: O caminho é uno, os desvios são muitos, cabendo a cada um encontrar o seu destino e um porto seguro para aportar, para não seguir sem rumo até o naufrágio.
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