sábado, 1 de maio de 2010

PASSADO... PRESENTE... FUTURO.








PASSADO:

Meus avós paternos moravam na fazenda Tanque Velho, não recebia conta de água, luz, telefone, Internet, celular, cartão de crédito, carnet de IPTU, INCRA, ITR, não pagava ISS,IR, imposto sindical, OAB, CREMEB, CROBA, CRA,CREA e outros CRs (ceerres), não recebia cobranças com ameaças de inserção no Serasa. SPC ou qualquer outro órgão de restrição ao crédito mesmo quando a conta está quitada. Meu avô tinha um pequeno comércio de carne em Irará-Bahia, gozava de bom conceito, foi eleito vereador e chegou a ser Presidente da Câmara, sem se corromper ativa ou passivamente. Minha avó trabalhava na roça capinando e plantando feijão, mandioca para o fabrico da farinha, do beiju e da tapioca, plantava fumo para consumo próprio e cuidava de outras culturas. Não tinha empregados porque todos que trabalhavam eram seus afilhados, morando na mesma área rural sem despesas e recebiam as contrapartidas sem reclamar, mesmo porque tinham casa, comida e todas as demais necessidades supridas. Com o que recebiam em dinheiro pelo trabalho empreendido nas plantações com o sistema denominado “Contrato de Parceria ou de Meia”, agradeciam ao Divino. Ildefonsa usava a força dos braços para o pilão que transformava em pó o grão do café que cultivava no quintal, e em fubá o milho colhido na pequena roça. A luz usada vinha do sol durante os dias e à noite a lua. Dentro de casa era o candeeiro abastecido com querosene que servia para alumiar seus passos. A água vinha de pequenas lagoas, sendo as “limpas” para beber após coarem com panos bem lavados, armazenadas em potes de barros e moringas, enquanto que as demais, que se dizia para o gasto, vinha de uma média represa denominada Tanque Velho. O fogão era abastecido à lenha retirada na propriedade, a carne era do boi ali abatido para o sustento de todos, cortada em fatias, dependuradas na corda ao sol para secar, armazenadas em potes com farinha para a sua conservação; o feijão era guardado coberto com areia fina peneirada, em tambores, após a colheita. Eram felizes. Meu avô morreu de enfarte com pouco mais de 60 anos pela imensa labuta e a minha avó aos 104 anos de idade, de morte natural, justamente porque não gostava da cidade com a sua “civilização e costumes”, que leva ao mercantilismo desumano e vale mais quem possui mais dinheiro, não importando a origem, geralmente ilícita.

PRESENTE:

– Após quarenta anos de estudo ininterrupto, vinte e sete anos de trabalho, pagando aluguel, luz, água e gás, transporte coletivo, condomínio e outras despesas, consegui construir uma casa (1981) que serve de abrigo para minha família. Aí começa a “via crucis” – pago IPTU, consumo de Água, Luz, Gás, Telefone fixo, celular, Internet, Imposto de Renda, IPVA porque tive a ousadia de comprar um carro para minha locomoção ao trabalho, combustível para o mesmo, Seguro Obrigatório, Seguro total (por exigência da financeira), Licença, Taxa de Iluminação, Taxa bancária porque tenho que manter uma conta corrente na instituição para receber o salário e sou obrigado a acessar a Internet para pedir a segunda via das faturas porque as empresas e os correios não entregam, todos mancomunados para a incidência de juros e multa que se é compelido a pagar, levando-nos ao estressamento total, somando-se o transporte coletivo para transportar as minhas filhas, a mensalidade do colégio porque o ensino público é deficiente, ITR e INCRA de uma pequena propriedade rural que adquiri para tentar descansar nos finais de semana.

Pergunto: Compensa?

FUTURO:

Vou me recolher ao tempo primitivo, ao tempo de minha avó, onde ouvirei o canto dos pássaros se ainda os encontrar; o latido do cão fiel se ainda existir; vou beber a água da fonte se não secou; vou me banhar no córrego se não se privatizou; vou dormir à noite para me descansar e fazer minhas leituras à luz clara do dia e respirar o ar quase puro do campo que os homens estão poluindo, antes que tenha que se pagar; vou andar pelas estradas de terra batida sem pedágio e para a viagem longa o cavalo e a bicicleta antes de enfartar; vou visitar o vizinho para conversar sem intermediários, sem correio e sem telefonia, livre da interferência global que nos escraviza e nos idiotiza; vou ler Schopenhauer (com seu “Aforismos Para a Sabedoria da Vida”), Nietzsche (para entender o Anti-Cristo), Newton (em sua visão matemática), Morus (com a sua Utopia), Sócrates (para conhecer a mim mesmo), Platão (com seus Diálogos e o mito da caverna), Aristóteles (o sábio dos sábios), Aristarco, Anaximandro, Anaxímenes, (para o inicio do pensar e a conceituação do universo), Diógenes (com a sua lanterna em busca do homem honesto), Rousseau, Voltaire, Diderot e D´Alembert (enciclopedistas com os seus conceitos revolucionários); vou ler Darwin para entender o evolucionismo e Einstein para compreender a relatividade do universo visível composto de vinte bilhões de galáxias com duzentas e vinte bilhões de estrelas cada uma delas, e reler a Bíblia para encontrar a divindade criada pelos homens, sem templos, sem dízimos e “sabidórios” a explorarem a boa fé dos incautos. Ou talvez, eu vá à simplicidade dos ignorantes e incultos porque melhor ainda seja não saber para não sofrer a incompreensão e a desilusão dos sábios, se não puder alcançar o Nirvana.


Feira, 17 de abril de 2010.