quinta-feira, 11 de setembro de 2014

VOU DE VOLTA PRO PASSADO


Vou de volta pro passado, porque a saudade é grande e a esperança de hoje não é verde, nem voa para o infinito dos caminhos floridos, das borboletas multicoloridas das campinas do Tanque Velho, por onde passam os paturis, as gaivotas e os espanta-boiadas. Vou-me embora, de volta ao passado, para ouvir o canto sonoro dos cardeais, dos canários amarelos, do pássaro preto, pra conversar com o papagaio-louro, que canta todas as manhãs a Maracangalha de Dorival Caymmi e que me chama carinhosamente quando ouve os meus passos. Lá encontrarei Jacy, morena linda das tardes quentes de Itapoã, das noites enluaradas, em acordes de violão e voz grave que rompe o silêncio das madrugadas, dos encontros amistosos de amigos sinceros em conversas alegres, das peladas, do jogo de gude, do jogo da capoeira ao som dos berimbaus que aprendi com Mestre Bimba, que me ensinou a arte da defesa pessoal e o respeito ao próximo. Vou sem vontade de ficar, porque aqui não é como lá. Aqui tem confusão, tem ladrão a toda hora, tem engodo e corrupção, tem crenças absurdas, tem enganadores de plantão nas portas e nos interiores de templos suntuosos, para exploração de incautos acéfalos, tem mentira a toda prosa, tem politiqueiro e politicagem sem escrúpulos, com promessas impossíveis. Tem marica e Maricota, tem Maria e tem João, e já não se sabe o que são. Lá, no passado, eu tenho livros a mão-cheia e espalharei versos de Augusto dos Anjos, Castro Alves, Fernando Pessoa, Camões e Bocage. Cantarei os versos de Orestes com a musicalidade do Caboclinho querido – Silvio Caldas e ouvirei Orlando Silva em suas canções chorosas, em versos brilhantes, que dizem – “Tu és divina e graciosa, estátua majestosa do amor, por deus esculturada...”. E, ainda assistirei Chico Viola no Cinema Iris, interpretando a “Aquarela do Brasil”, que consagrou o mineiro de Ubá, para o mundo. Ao cair da tarde, às 18 horas, ouvirei a Ave Maria de Gounot ou de Schubert, rezarei o Pai Nosso e a Ave Maria, que aprendi no catecismo ali na Igreja dos Remédios, das aulas de Dona Pombinha. Às 19 horas saberei das notícias governamentais através da “Hora do Brasil”, em rede nacional, sabendo que estamos bem representados, porque a seriedade dos homens não se extinguiu. Vou de volta pro passado, por não conhecer o caminho que leva a Pasárgada, e não me chamem para o presente, porque nele não vejo futuro.
Feira, 30 de julho de 2014.