terça-feira, 22 de novembro de 2022

 DA NOBREZA DE SER


 "Coração é uma riqueza que não se vende nem se compra. Presenteia-se".

( Gustave Flaubert) 


O contato humano, ameno,

 É como a rosa que ornamenta, perfuma e contagia, 

Impregnando-nos com sua essência vital e necessária, 

Envolvendo-nos em sua beleza, 

Tornando-nos dóceis 

E prontos para o amor e para a vida. 

É como se a inteligência se aclimatasse

 A outra inteligência 

Por identidade ontológica,

 Por razão que transcende 

O plano consciente, 

Que não chega ao entendimento dos medíocres 

E mal amados. 

O relacionamento humano 

Quando advindo de um prisma magnânimo, 

Acrisola o Ser,

Projeta-nos num campo emocional 

Estável, de bem-aventurança 

E criatividade, 

Que chega a confundir-se com o místico. 

Diviniza-nos 

E nos conforta 

Para a vida e para a morte. 


Brasília, 26.08.1978.

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

     MARIA

 

 Minh’alma é rosa que geada esfria...

Dá-lhe em teus seios um asilo brando...

Leva-me! Leva-me, ó gentil Maria!...

 

(Castro Alves)

 

Maria

frô brejêra

frô sôdade

frô Maria.

  

Maria

se eu te pego

eu me dano todo...

eu nem sei Maria 

que diabo é que eu fazia!?


 Eu te beijava!

eu te abraçava!

eu te mordia!...

eu te cheirava!

eu te amassava!

eu te sentia!...

 

No fim, eu te tomava,

eu te bebia,

pra que tu fosse minha ...

ó frô das frores bela ...

a frô que é tu Maria.

 

                                         Rio de Janeiro.  11.11.64

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

 VERSEJANDO 

Vou caminhar 

Por onde voam os pássaros

E passear em seus gorjeios matutinos 

Em cânticos maviosos, 

Nas arvores frondosas 

Onde outrora cantavam 

As cigarras noturnas 

De Olegário Mariano. 

Vou alcançar as estrelas 

Que diziam versos 

Para Olavo Bilac 

Em sua imaginação gloriosa,

 Enquanto amava a mais linda das mulheres. 

Vou refugiar -me 

Nas palmeiras 

Compridas, 

No pouso das sabias

 De Gonçalves Dias, 

Porque “as aves que aqui gorjeiam, 

Não gorjeiam como lá”. 

Vou esquecer da dor do mundo 

E da simbiose , 

Da hemoptise 

Sofrida dia a dia 

Por Augusto dos Anjos 

E voar como o condor 

Que adeja o espaço infinito, 

Que não conhece o limite 

Contido na imaginação 

De Victor Hugo 

Ou no condoreirismo 

De Castro Alves. 

Vou quedar -me silente, 

Inerte e inerme, 

Na poltrona de Schopenhauer 

Para não dizer mais nada.


 07.12.2010.


segunda-feira, 12 de setembro de 2022

 

ANDANÇAS DA JUVENTUDE

                           

Aos dezessete anos

Eu amava Joanita

E fazia sexo com Nazinha.

 

Aos dezoito anos

Eu amava Lúcia

E tinha saudades de Nilza

Minha primeira namorada

Que antecedeu aquela morena linda

Da Avenida Senhor dos Passos

Cujo nome não guardo na memória.

 

Aos dezenove anos

Eu amava Zulenice

A programista.

 

Aos vinte anos

Eu me apaixonava por Lúcia

Deslumbre e ansiedade da minha juventude.

 

Ainda aos vinte anos eu amava Linda

A musa inspiradora, a pura,

A que fez vibrar a minha veia poética,

Musa das minhas serenatas.

 

Aos vinte e um anos

Eu vivi Ana Maria

A meiga, a loira,

E sonhei abraçado

Ao corpo belo e moreno

De Isabel.

 

Ainda aos vinte e um anos

Eu era amante e amava

Em todos os bordéis

Onde tinha chinelo,

Escova e pasta de dente.

 

Aos vinte e dois anos

Eu era o deleite de cem mulheres

E em pleno vigor,

Amava no leito de forma insaciável

A mais linda das mulheres.

 

 

Aos vinte e três anos

Eu amei loucuras

 

E aos vinte e quatro anos

Eu me entreguei aos estudos

Buscando desesperadamente o tempo perdido.

        Feira de Santana, em um dia qualquer do ano de 2008.

quinta-feira, 17 de março de 2022

 

PRAÇA DO NORDESTINO

 

 (Da série Filhos da Princesa).

 

  Dos filhos da Princesa que habitavam a Praça do Nordestino, como era conhecida, ainda me lembro, - Sevilho Carneiro o fazendeiro honrado com imensas terras no distrito de Jaguará; o Promotor de Justiça descendente de Castro Alves - o poeta dos escravos de versos líricos e libertários que pregava – “Oh! Bendito o que semeia Livros... livros a mão cheia e manda o povo pensar, o livro caindo n´alma é germe que faz a palma, é chuva que faz o mar”. O que dizia “Sou pequeno, mas só fito os Andes”. Lembro da família Cunha de D. Tereza de brilhantes festas em sua residência reunindo amigos para comemorar aniversários inesquecíveis, de prole digna; de Dona Petu com sua altivez, de ar tranqüilo como a rocha que não se abala com as intempéries, e de seus netos que se fizeram doutores e professores honrando a Princesa; da moça linda da esquina com a Rua Carlos Gomes, que passava fagueira pisando macio, de corpo leve e escultural, que como uma garça sombria trazia inveja no seu caminhar; do moço que por algum tempo roubou minha namorada da Usina de Algodão; de Teodorico próspero comerciante; da Pensão Brasil de Mané Quaresma que mesmo com muitas andanças pôde educar seus filhos; Barreto o bancário e sua glamorosa esposa das colunas sociais de Eme Portugal, com o bom vizinho Chico Maia de saudosa lembrança. Ali naquele logradouro público, imponente, ficava o Abrigo Nordestino do encontro de boêmios vindos de suas serenatas, onde se tomava o bom conhaque de Alcatrão São João da Barra para “cortar a gripe” colocando-o no pires com um pouco de açúcar, riscando o fósforo e tocando fogo, após, abafando, era servido em taça ainda quente, antes do sono do guerreiro. Muitas foram as noites que pela madrugada de violão em punho, vindos das serestas, cantávamos o vasto repertório de Francisco Alves, o Chico Viola, Rei da Voz – “A lua vem surgindo cor de prata, do alto da montanha verdejante, na lira do cantor em serenata, reclama da janela a sua amante...”. Pois é, como dizia Ataulfo Alves – “falaram tanto que a morena foi embora...”, e foram todos. Restam casas comercias na agonia do materialismo voraz, do eterno enriquecer e até o abrigo de muitos encontros transformaram em loja de confecções. Não mais o pão com manteiga, o cafezinho quente, o conhaque e o bom churrasco servido para os homens da noite e para os viandantes de plagas distantes que passavam cruzando norte/sul e vice versa. As famílias hoje se abrigam em Condomínios protegidos por guaritas e seguranças, fugindo dos marginais gerados na “barriga da miséria” (Chico Buarque). Não mais as matinês do Cinema Íris de Belarmino com sua lanterna a retirar os “moleques” do ressinto, das segundas-feiras das fitas de Caubói, de Billy Elliot, Zorro, Roy Rogers, Cavaleiro Negro, Flash Gordon no Planeta Ming, O Gordo e o Magro, Três Patetas, das cortinas abrindo ao som de “Oh abre a cortina do passado, tira a mãe preta do cerrado, bota o rei congo no congado, Brasil! Brasil!”. Penso minha Princesa, que o progresso é a contramão do humanismo e o materialismo é a estrada por onde vão par e passo a fartura e a fome, caminhando juntos para o nada.

 

Feira, 11.06.2009. 

 

 

                        MILTON DE BRITTO

ADVOGADO, ESCRITOR, POETA, FILOSOFO,

           MEMBRO DA AFL E DO IHGFS.

 

PRAÇA FRÓES DA MOTA

 

(DA SÉRIE FILHOS DA PRINCESA).

 

 Década de 50.

 

Era uma praça linda, toda arborizada, com bancos espalhados em todos os seus espaços. Em sua volta inúmeras palmeiras imperiais, um Coreto ao centro recebia nos finais de semana e nos períodos festivos as filarmônicas Vinte e Cinco de Março, Euterpe e Vitória, que executavam Dobrados, Marchas e outras músicas do repertório popular de bom gosto. As famílias se acomodavam em volta, confraternizando-se, vivenciando amizades sinceras no ecletismo de suas formações intelectuais. Naquele logradouro, residiam nobres e plebeus, mas todos se respeitavam. Na esquina da praça, confluência do beco de saída da Rua de Aurora, morava Eurico, estudante comportado de grande habilidade com a bicicleta Raling fazendo malabarismo e equilíbrio a ponto de ficar parado por alguns minutos com a admiração dos amigos, sendo premiado com medalha em concurso daquela modalidade. Eme Portugal, um dos filhos da Princesa, era um dos residentes, tendo se destacado como Colunista Social, promotor das mais belas festas sociais, a exemplo do “Broto do Ano”. A família Martins (Afonso) gerou dois dos melhores jogadores de futebol do Estado e do Brasil – Adilson e Val. Joel Magno enveredou-se pelo caminho da comunicação, dedicando-se ao Rádio. Flori era bancário, Dr. Salustio médico e Luis Carlos filho do dono da Pensão que tinha como empregado o conhecido João Burguês, canarista militante, criador de canário de briga e que constantemente saía vencedor nas rinhas. Na esquina descida para a Rua do Nagé numa casa ampla morava Abelardo próspero proprietário da Padaria Duas Américas na Rua Tertuliano Carneiro (conhecida Rua Direita) com os destacados filhos Zé Pão e Toinho, ambos da área artística, que tinha como vizinhos Clemilton e mais ao lado a família Mascarenhas da Padaria da Fé, do pão quentinho, da queijada e do bolachão fofo. Esquina com a Rua São José um Prédio com um andar, funcionando na parte de baixo o fabrico de vinhos e licores de Dande e na parte de cima a Pensão que abrigava Edna a musa de muitas inspirações da rapaziada da Praça e de cantigas entoadas pelo escriba, retiradas do repertório de Dick Farney – “Não pensei que seus olhos fossem tão traidores, não pensei que seus olhos me trouxessem dissabores; não pensei que seus olhos transformassem meu viver; olhos negros cruéis tentadores, de mil amores que fazem sofrer...”. Vivenciando esse tempo, lá se encontrava na esquina com a Rua Tertuliano Carneiro a Rádio Sociedade, primeira Emissora da Princesa de propriedade de Pedro Matos, com seus programas de calouros e de astros, com auditório repleto, por onde passaram Dudinha, Chico Baiano, Toninho e Maninho ao violão, o velho Dôca e Geraldo Borges, (locutores e cantores). Por lá passei, cantei e fui para o Rio de Janeiro gravar na RCA VICTOR. Foram muitos encontros e poucos desencontros na Praça, que inspiraria o poeta a dizer: “Pelos teus caminhos brinquei, vadiei, amei e fui moleque; pelos teus jardins me escondi em jogos de “Chicotinho Queimado”, “Boca de Forno”, joguei confetes e lança-perfumes nas vestes e nos corpos de lindas donzelas; comprei alferes, taboca e doce de banana (mariola); fiz da minha vida uma festa que o tempo levou sem piedade; versifiquei até que te vi ausente de meus sonhos, desfeita e desfigurada, sem a possibilidade do encontro”.

 

 Feia de Santana, 05 de maio de 2009.

 

                    MILTON PEREIRA DE BRITTO

Advogado, Filósofo, Escritor, Poeta, Compositor, Violonista, membro da AFL, ACAFS, ALJFS E DO IHGFS.

 

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022