segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

UMA DEUSA CHAMADA SONIA.

Sonia era um monumento vivo que surgiu, de repente, na vida de Pereira, funcionário público, chefe de repartição, num momento de conflito interno, advindo de uma separação conjugal desastrosa. Chegou bela, como se tivesse fugido do Olimpo ou do Jardim do Éden. Parecia uma deusa pronta para se desnudar no leito com seu corpo lânguido, macio, de pele rosada e macia, calada, para não dizer melodicamente a razão de sua presença. Diante daquele homem, embasbacado, vindo de desilusões amorosas, atônito, pensou que poderia ser o seu grande momento de inspiração para versejar e morrer de amor. Poderia ter sido o seu maior momento. Temeroso, com os desacertos do passado e a conturbação do momento, fugiu. Era a sua obrigação ministrar tarefas e obrigações para aquela que iria trabalhar na mesma repartição e, como que por castigo, ali do seu lado, para se ver tanta beleza sem poder usufruir. Resolveu apresentá-la ao amigo, companheiro de labuta, Ziza, mulato simpático, ex-jogador de futebol do Clube Atlético Mineiro, passando-lhe a responsabilidade do ensinamento do serviço burocrático. Foram tantos os contatos diretos que, inevitavelmente, se envolveram em um romance de fazer inveja ao coração mais empedernido e decepcionado. Percebia-se um amor vivenciado com paixão e loucuras de alcova. Para consolar Pereira, que se via só a cada dia, apresentaram-lhe uma amiga, magra, esguia, que talvez suprisse o equívoco de ter presenteado o amigo com aquela que seria a sua grande paixão das alterosas. Tentou o romance, mas em vão foram as suas tentativas de conquista com aquela que se fazia difícil de tal forma que, da possibilidade da embriaguez amorosa, surgiu a antipatia, motivando-lhe, por vingança, a construção de uma poesia:
BRUXILDA Nº 2
(OPUS SAPO).

NARIZ ARREBITADO,
LIGEIRAMENTE ACEBOLADO.
BOCA – CORTE RÁPIDO,
FINO, DISFARSANDO EM LÁBIOS,
LADEADA POR DUAS PAPEIRAS MURCHAS E FLÁCIDAS.
OLHO DE VIDRO – AVAMPIRADOS,
TERRORIFICANDO AS NOITES.
TESTA CURTA, PECULIAR AOS BAGRES.
CABELOS AMILHARADOS,
DE FEDOR PRESENTE,
ESVOASSADOS,
COMO SE FOSSEM VINDOS
DA TOURNNÉ LÚGUBRE DAS VASSOURAS TORTAS.
PERNAS ASSABIADAS,
MURCHULENTA BUNDA,
CORPO PONTILHADO DE VERRUGAS MORTAS.
UM TODO DE MACABRO,
UM MISTO DE MORTE-NASCENDO.
ENFIM, A COMPOSIÇÃO DO MEDO,
INEXISTINDO E SENDO:
BRUXILDA DA SILVA SUSTO.

B. H. 5/5/1972. (EM UM DIA DE MEDO).