domingo, 4 de outubro de 2020

 

                                                              MARGOT

 

Nascida no Bairro de Cascadura, subúrbio da Central do Brasil, Zona Norte, da cidade do Rio de Janeiro, cresceu e viveu até os l7 anos, no ambiente familiar, com princípios morais rígidos, freqüentando a escola pública, por pertencer a uma família de classe média baixa, sob a influência da religião católica, indo às missas aos domingos, onde foi batizada e crismada.

Concluindo o segundo grau do ensino fundamental (à época – curso primário, ginasial e científico), aos 18 anos Margot iniciou nos finais de semana, a freqüência nas praias de Copacabana, em companhia de algumas amigas.

Década de 40/50 (1940/1950), Copacabana era a Princesinha do Mar, cantada em verso e prosa, por Antonio Maria, Braguinha, Luis Bonfá, deslumbre das vedetes e da vida artística da Zona Sul da Cidade do Rio de Janeiro.

Todos sonhavam em conhecer e vivenciar Copacabana, com suas Boates, Bares, Restaurantes, Teatros, Casas de Show de todo tipo, incluindo Cassinos, sendo os mais famosos o Cassino da Urca e o de Copacabana.

Nos primeiros fins de semana, Margot já se enturmou com alguns moradores do bairro boêmio, iniciando encontros amorosos.

De repente, nada mais que de repente, Margot se fez mulher, linda, em todos os sentidos, com um corpo escultural, pele macia, levemente bronzeada, cabelos levemente aloirados, olhos azuis, dentes brancos e bem tratados, passando a ser vista como possível modelo para os desfiles carnavalescos em carros alegóricos e na passarela do Teatro Municipal, do Hotel Glória, Clube Sírio Libanês, Hotel Quitandinha, não faltando quem a incentivasse, logo surgindo interessados e patrocinadores.

Com 18 anos, (1940), após freqüentar a Zona Sul, comunicou aos familiares a sua decisão definitiva, de ir morar em Copacabana, argumentando que para tanto havia conseguido um emprego como modelo em loja de confecção de “alta costura”.

Mesmo contrariados, os pais perceberam que não conseguiriam demovê-la da decisão, desejando-lhe felicidade no seu intento.

Alguns amigos conseguiram-lhe uma escola de modelos, a exemplo da famosa “Socila” onde aprendeu a desfilar.

Chegando o período carnavalesco, Margot, já bem entrosada, consegue um patrocínio para o primeiro desfile no Teatro Municipal do Rio de Janeiro.

Vestiram-na de Rainha, com vestes deslumbrantes, conseguindo-lhe o segundo lugar na premiação, sendo manchete em jornais e revistas, emissoras de Rádio, destacando-se na capa do principal semanário - Revista dos Artistas.

Admirada por muitos, desejada e cortejada, logo apareceram os barões endinheirados, empresários, deputados, senadores, ministros, jornalistas, artistas, propondo-lhes encontros, compromissos escusos, concubinatos, oferecendo-lhe jóias, carros, apartamentos, mas, a esta altura dos acontecimentos, Margot sabia o que queria e isto implicava em uma boa casa confortável, sem compromisso firme e exclusivo.

Com um Senador da República conseguiu uma bela Mansão na Avenida Atlântica, principal artéria pública de Copacabana, de frente para o mar.

De caso amoroso com o idoso parlamentar, passou a gozar de uma situação financeira confortável, seguindo a sua carreira de modelo, freqüentando as casas noturnas, ora com o Senador, ora com outros admiradores, em segredo, para não contrariar aquele que era o principal patrocinador.

Despertada para o sexo, tornou-se uma mulher fogosa, cheia de desejos, cujas satisfações seriam saciadas por jovens rapazes bonitos e saudáveis.

Passaram-se vinte anos. Noites perdidas, cigarro, bebida alcoólica e outras drogas consumidas, foram tirando a beleza de Margot.

O tempo não pára, é cruel e o físico humano decai, a beleza se esvai, se dilui, os patrocinadores do belo desaparecem e a sobrevivência no padrão de alto luxo é difícil.

As beldades vão se sucedendo, surgem novos padrões de beleza, a situação financeira é instável, a política muda, o Senador não se reelege, o Ministro se aposenta, a velhice acomoda, invalida a atividade sexual, a ciranda do poder é inevitável, é fugaz e vulgar, o tempo não perdoa.

A vida é como o elevador – sobe e desce e nem sempre os passageiros são os mesmos.           

Os múltiplos desfiles premiados de Margot deram-lhe fama, amantes, dinheiro, conforto, viagens, jóias, carros, tudo que jamais tenha imaginado uma garota de subúrbio da Capital do País, denominada – Cidade Maravilhosa, também conhecida como berço de sonhos e desilusões, na versão do poeta.

Os recursos financeiros de Margot iam se consumindo a partir do momento em que se via sem o patrocínio do Senador (já aposentado e sem a libido), sem os mesmos atrativos de ontem, a outrora suburbana, entra em decadência e começa a dilui o que ganhou, tendo que sustentar cafetãs, tendo que vender a Mansão, o carro, as jóias e até as suas fantasias.

Década de 60, de Bar em Bar, faz sua ronda noturna aquela que foi uma das mais lindas vedetes de Copacabana, uma das certinhas do Lalau (Stanislau Ponte Preta), que desfilou nas passarelas, do Teatro Municipal, Hotel Quitandinha, Hotel Glória, bebendo agora o Vermute, o Martine, e o raro uísque que lhe paga algum amigo do passado, até retornar ao seu kitinet no Edifício Ritz, na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, reduto dos que sonharam e adormeceram em suas próprias frustrações, nos versos de Haroldo Barbosa, na voz de Nora Ney:

Bar da Noite

Garçom apague esta luz

Que eu quero ficar sozinha

Garçom me deixe comigo

Que a mágoa que eu tenho é minha

Quantos estão pelas mesas

Bebendo tristezas

Querendo ocultar

O que se afoga no copo

Renasce na alma

Desponta no olhar

 

Garçom, se o telefone bater

E se for pra mim

Garçom repita pra ele

Que eu sou mais feliz assim

 

Você sabe bem que é mentira

Mentira noturna de bar

Bar, tristonho sindicato

De sócios da mesma dor

Bar que é o refúgio barato

Dos fracassados do amor

 

Em 1990, com 68 anos de idade, sob a proteção de um admirador (amante de outrora), consegue a nossa vedete, abrigar-se na Casa dos Artistas, no distante bairro de Jacarepaguá, onde se encontram estrelas e astros que brilharam no universo de sonhos e fantasias.

 

Feira de Santana, 04/10/2020

 

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