MARGOT
Nascida no Bairro de Cascadura,
subúrbio da Central do Brasil, Zona Norte, da cidade do Rio de Janeiro, cresceu
e viveu até os l7 anos, no ambiente familiar, com princípios morais rígidos,
freqüentando a escola pública, por pertencer a uma família de classe média
baixa, sob a influência da religião católica, indo às missas aos domingos, onde
foi batizada e crismada.
Concluindo o segundo grau do ensino
fundamental (à época – curso primário, ginasial e científico), aos 18 anos Margot
iniciou nos finais de semana, a freqüência nas praias de Copacabana, em
companhia de algumas amigas.
Década de 40/50 (1940/1950),
Copacabana era a Princesinha do Mar, cantada em verso e prosa, por Antonio
Maria, Braguinha, Luis Bonfá, deslumbre das vedetes e da vida artística da Zona
Sul da Cidade do Rio de Janeiro.
Todos sonhavam em conhecer e vivenciar
Copacabana, com suas Boates, Bares, Restaurantes, Teatros, Casas de Show de
todo tipo, incluindo Cassinos, sendo os mais famosos o Cassino da Urca e o de
Copacabana.
Nos primeiros fins de semana, Margot
já se enturmou com alguns moradores do bairro boêmio, iniciando encontros
amorosos.
De repente, nada mais que de repente,
Margot se fez mulher, linda, em todos os sentidos, com um corpo escultural,
pele macia, levemente bronzeada, cabelos levemente aloirados, olhos azuis,
dentes brancos e bem tratados, passando a ser vista como possível modelo para
os desfiles carnavalescos em carros alegóricos e na passarela do Teatro
Municipal, do Hotel Glória, Clube Sírio Libanês, Hotel Quitandinha, não faltando
quem a incentivasse, logo surgindo interessados e patrocinadores.
Com 18 anos, (1940), após freqüentar a
Zona Sul, comunicou aos familiares a sua decisão definitiva, de ir morar em
Copacabana, argumentando que para tanto havia conseguido um emprego como modelo
em loja de confecção de “alta costura”.
Mesmo contrariados, os pais
perceberam que não conseguiriam demovê-la da decisão, desejando-lhe felicidade
no seu intento.
Alguns amigos conseguiram-lhe uma
escola de modelos, a exemplo da famosa “Socila” onde aprendeu a desfilar.
Chegando o período carnavalesco,
Margot, já bem entrosada, consegue um patrocínio para o primeiro desfile no
Teatro Municipal do Rio de Janeiro.
Vestiram-na de Rainha, com vestes
deslumbrantes, conseguindo-lhe o segundo lugar na premiação, sendo manchete em
jornais e revistas, emissoras de Rádio, destacando-se na capa do principal semanário
- Revista dos Artistas.
Admirada por muitos, desejada e
cortejada, logo apareceram os barões endinheirados, empresários, deputados,
senadores, ministros, jornalistas, artistas, propondo-lhes encontros,
compromissos escusos, concubinatos, oferecendo-lhe jóias, carros, apartamentos,
mas, a esta altura dos acontecimentos, Margot sabia o que queria e isto
implicava em uma boa casa confortável, sem compromisso firme e exclusivo.
Com um Senador da República conseguiu
uma bela Mansão na Avenida Atlântica, principal artéria pública de Copacabana,
de frente para o mar.
De caso amoroso com o idoso
parlamentar, passou a gozar de uma situação financeira confortável, seguindo a
sua carreira de modelo, freqüentando as casas noturnas, ora com o Senador, ora
com outros admiradores, em segredo, para não contrariar aquele que era o
principal patrocinador.
Despertada para o sexo, tornou-se uma
mulher fogosa, cheia de desejos, cujas satisfações seriam saciadas por jovens
rapazes bonitos e saudáveis.
Passaram-se vinte anos. Noites
perdidas, cigarro, bebida alcoólica e outras drogas consumidas, foram tirando a
beleza de Margot.
O tempo não pára, é cruel e o físico
humano decai, a beleza se esvai, se dilui, os patrocinadores do belo
desaparecem e a sobrevivência no padrão de alto luxo é difícil.
As beldades vão se sucedendo, surgem
novos padrões de beleza, a situação financeira é instável, a política muda, o
Senador não se reelege, o Ministro se aposenta, a velhice acomoda, invalida a
atividade sexual, a ciranda do poder é inevitável, é fugaz e vulgar, o tempo
não perdoa.
A vida é como o elevador – sobe e
desce e nem sempre os passageiros são os mesmos.
Os múltiplos desfiles premiados de
Margot deram-lhe fama, amantes, dinheiro, conforto, viagens, jóias, carros,
tudo que jamais tenha imaginado uma garota de subúrbio da Capital do País,
denominada – Cidade Maravilhosa, também conhecida como berço de sonhos e
desilusões, na versão do poeta.
Os recursos financeiros de Margot iam
se consumindo a partir do momento em que se via sem o patrocínio do Senador (já
aposentado e sem a libido), sem os mesmos atrativos de ontem, a outrora
suburbana, entra em decadência e começa a dilui o que ganhou, tendo que
sustentar cafetãs, tendo que vender a Mansão, o carro, as jóias e até as suas
fantasias.
Década de 60, de Bar em Bar, faz sua
ronda noturna aquela que foi uma das mais lindas vedetes de Copacabana, uma das
certinhas do Lalau (Stanislau Ponte Preta), que desfilou nas passarelas, do
Teatro Municipal, Hotel Quitandinha, Hotel Glória, bebendo agora o Vermute, o
Martine, e o raro uísque que lhe paga algum amigo do passado, até retornar ao
seu kitinet no Edifício Ritz, na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, reduto
dos que sonharam e adormeceram em suas próprias frustrações, nos versos de
Haroldo Barbosa, na voz de Nora Ney:
Bar da
Noite
Garçom apague esta luz
Que eu quero ficar sozinha
Garçom me deixe comigo
Que a mágoa que eu tenho é
minha
Quantos estão pelas mesas
Bebendo tristezas
Querendo ocultar
O que se afoga no copo
Renasce na alma
Desponta no olhar
Garçom, se o telefone
bater
E se for pra mim
Garçom repita pra ele
Que eu sou mais feliz
assim
Você sabe bem que é
mentira
Mentira noturna de bar
Bar, tristonho sindicato
De sócios da mesma dor
Bar que é o refúgio barato
Dos fracassados do amor
Em 1990, com 68 anos de idade, sob a
proteção de um admirador (amante de outrora), consegue a nossa vedete,
abrigar-se na Casa dos Artistas, no distante bairro de Jacarepaguá, onde se
encontram estrelas e astros que brilharam no universo de sonhos e fantasias.
Feira de Santana, 04/10/2020