segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

CARTA AO AMIGO AMARAL (CLUDELSON PESSOA DO AMARAL)

 

Feira de Santana, Bahia, Junho de 2013.

 

 Caro amigo Amaral,

 

Deixei o Rio em abril de 1969, notando uma coincidência inexplicável, porque cheguei nesta antiga Capital da República, exatamente em abril de 1961, cheio de sonhos, que não foram realizados por inteiro, porque foram interrompidos, por motivos alheios à minha vontade.

Não pude me despedir do amigo, e por isto, através desta carta, tento relatar e reviver fatos, que precisam ser ditos e partilhados, até como um desabafo, como diz o poeta – “falar para não enfartar”.

Você, talvez, deve se lembrar, que deixei a vida artística em 68, em conseqüência de atos cometidos por membros da ditadura que se iniciou em 1º de abril de 1964, quando, dentre tantas barbaridades cometidas, fecharam a Rádio Nacional, a Mayrink Veiga e a TV Continental, onde se davam as minhas apresentações, com muita freqüência e ensejou a minha gravação na RCA VICTOR. Para completar, fecharam a Boate Michel e o Restaurante Le Rond Point, onde eu cumpria contrato, bem remunerado. Daí, final de 67 para 68, busquei novas atividades, após retomar os estudos e nos encontramos em busca de emprego, nos escritórios de venda de Seguro de Saúde, do Hospital Silvestre. Trabalhamos juntos e após várias incursões, tivemos a idéia de vendermos a idéia para implantação do Seguro de Saúde a se estender pelo Brasil, começando pelo Rio. Conseguimos iniciar o projeto. Você comprou um Retroprojetor da 3M, próximo ao Aeroporto Santos Dumont, fizemos uma demonstração do projeto, no IBIC, em Botafogo, Hospital Cardiológico de um amigo judeu – Dr. Edidio, que nos deu crédito e abrigo, para depois Castelo Branco baixar um Decreto suspendendo a implantação do Seguro de Saúde no país, atendendo aos interesses da Blue Cross e aí, ficamos na rua.

Montamos um Curso de Taquigrafia e Madureza, na Rua do Catete, e lecionávamos Francês e Inglês, na Paróquia da Glória, que foi fechada, se não me engano, em 68, pelo DOPS, que levou todos para o Campo do Botafogo, alegando que ali abrigava um bando de comunistas. Escapamos nós, que estávamos no cursinho e depois disso nos desarticulamos.

Segui para concluir meus estudos em Filosofia e prestar vestibular para Direito. Estudei latim, grego, espanhol, italiano e aprimorei o francês. Para tanto, sai do Rio e fui para a Bahia. Em 70, retornei para o Rio. Marivone, com quem eu havia convivido, tinha morrido. Fui morar em Santa Tereza, após um casamento desastroso, que jamais deveria ter acontecido. Em 73, após vários empreendimentos frustrados na Cidade Maravilhosa, segui para Belo Horizonte, Minas Gerais. Aprovado duplamente em vestibular para Direito, cursei inicialmente na UCMG, depois FADOM, UCMG, UNB – Brasília, UCSAL, FESPI, e, em 1980 conclui, por coincidência em abril. Parece que tudo acontece em abril.

De retorno a Bahia, fui nomeado Procurador do Município de Feira de Santana, exercendo, também, a advocacia, com a qual sobrevivo até hoje.

Escritor, poeta, tenho vários livros publicados. A música, por ser um dom, do qual não pretendo me divorciar, amadoristicamente, todos os anos, gravo um CD.

Do amigo tenho boas lembranças, incluindo a minha admiração pela sua inteligência privilegiada.

Lembro das nossas idas para comer um bom pastel de queijo com caldo de cana, na Rua Senador Dantas e das nossas boas conversas.

Lembro também - das poesias que eu escrevia, rodava no mimeógrafo da Paróquia e distribuía no Largo do Machado. Você lembra?!

Aproveito para manda-lhe um abraço, desejando-lhe muita paz e felicidade.

 Att.

 Milton Britto

 PS.: Esta carta faz parte das páginas do meu Livro “CARTAS NÃO REMETIDAS”.