sábado, 19 de março de 2011
BRINQUEDOS DE CRIANÇA
Quando criança, ainda, com quatro anos de idade, tenho por lembrança, os meus primeiros brinquedos e traquinices. Na casa de meus pais, um casarão localizado na Rua Direita, na parte de baixo ficavam a sala, a cozinha e um quintal imenso que terminava na Rua de Aurora, onde subíamos nas arvores, brincando de gangorra, amarrando duas cordas em um galho e na parte de baixo uma tábua para sentar, enquanto alguém nos embalava, se revezando eu e meus dois irmãos. Na parte de cima, um Sótão, com uma escada por onde eu descia pelo corrimão, fugindo das palmadas de minha futura madrasta. Tenho lembrança dos três carneiros que ganhamos de presente de meu pai, com os quais íamos para o Rio de Jacuipe, para tomar banho e banhar os ovinos grandes e lanzudos. Tínhamos medo de um personagem de rua chamado “Seca Fonte”, doido, inofensivo, mas que os adultos usavam-no para amedrontar a criançada, dizendo que ele apresentava perigo. Não sei que fim levou o pobre coitado.
Na rua, brincávamos de “picula”, que era uma forma de um conseguir pegar o outro que se esquivava; o chicotinho queimado era representado por uma varinha que escondíamos para que alguém a encontrasse e quem conseguia a proeza corria atrás dos outros para cipoar. Tinha a “boca de forno”, que começava assim: “Boca de forno. Forno. Tomai um bolo. Bolo. Fazei o que eu mandar? Sim!” – Seguia uma tarefa que cada um tinha que cumprir. Por exemplo – Missinho vai dar um beijo em Aninha. Realizada a tarefa, seguia-se outro e mais outro. Aquele que não cumpria a tarefa tomava “bolo” na palma da mão, ou seja, estendia-se a mão, enquanto outro lhe batia com as mãos. Os barbantes que amarravam os pães serviam para construirmos com as mãos formas diferentes, enredando-os com os dedos, até se esgotarem a capacidade de novas formas. Mais parecia uma teia de aranha. Os peões com as cordinhas, eram jogados e giravam, quando os mais habilidosos apanhavam-nos com as mãos fazendo piruetas. Para as corridas, marcávamos com giz uma linha para a partida, ficando todos alinhados, indo para um outro ponto, sendo vencedor aquele que chegava primeiro. Algumas vezes dava discussão e até briga. Nada que não se podia contornar. Lembro do dia que Edinho, vindo da padaria de Seu Abelardo, brincando de cego, tateando com as mãos a parede das casas, não percebendo o recuo da porta, bateu com a testa na quina da parede, o que lhe valeu um corte pequeno, sangrando, que nos preocupou. Nunca mais ele quis saber deste brinquedo. Esses brinquedos da primeira infância perderam a motivação, quando chegaram, vindo da capital, dois irmãos, Renatinho e Dudu, netos de Abílio Ribeiro, com seus carrinhos de dar corda, um mecanismo moderno para a movimentação dos mesmos, causando-nos inveja. Brinquedo de rico. Em 1945, minha mãe morre vítima de picada de “barbeiro” (inseto hemíptero), (doença de Chagas), que aumenta o volume do coração levando o paciente a óbito. Mudamos para a Rua Santos Dumont, próxima da Praça Froes da Mota e da Rua São José. Esquecemos da humilhação de não podermos possuir brinquedos sofisticados e passamos a fabricar os nossos. Aí, construímos patinetes, com tábuas que conseguíamos de caixões desmontados, sendo que, na parte de baixo abríamos dois cortes introduzindo rolimãs e na parte da frente uma borracha de câmara de ar de pneu de carro, fixando as duas partes, sendo que, a superior atuava como guidom. Surgiram os carros de madeira que também fabricávamos com o auxilio de Francisquinho, filho de bom carpinteiro, que se encarregava dos detalhes. A pista era o passeio na lateral esquerda da Rua São José, cujo quarteirão era ocupado pela casa de Manoel Brito e um prédio onde funcionava uma Pensão, que me inspirou muitas cantorias do repertório de Dick Farney, com o fito de conquistar a filha da pensionista, que terminou se casando com um amigo espanhol que lhe apresentei. Perdi a futura namorada e o amigo. Na adolescência os nossos brinquedos se restringiam aos jogos de bolas de gudes; empinando arraias (pipas ou papagaios); futebol de campo e de salão, nas várzeas do Campo Limpo ou do Feira Tênis Clube. Dali, saíram grandes craques como Adilson, Val, Chinezinho, Nego Minho e outros. Enquanto isto, nas portas das casas, ficavam as meninas brincando e cantarolando “Escravos de Jô”, “Ciranda, Cirandinha” e nas festas de São João, pulando fogueiras, faziam-se compadres e comadres. Tempo do Cinema Íris com seus filmes de Caubói às segundas-feiras, com Buck Jones, Zorro, Roy Rogers, Tarzan o Rei das Selvas com sua macaca Chita e sua mulher Jane. Tempos que se foram e que não voltam mais. Os brinquedos acabaram-se, os cinemas fecharam-nos, as crianças cresceram, os rapazes se foram, os adultos morreram em suas inocências de homens íntegros, ou estão morrendo de desgostos e de tristeza, por não conseguirem socializarem e humanizarem a sua própria raça. Resta o mito, como consolo. O homem ama a Deus, que ama o homem que não ama o homem. É preciso descobrir a criança que existe em cada um de nós, com mais amor e menos crendice absurda em deuses que castigam quem não os reverenciam.
Feira, 12 de março de 2011.
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